o ritmo - #ed15
- du

- 16 de jun.
- 6 min de leitura
Atualizado: 26 de ago.
esse é o fim de mais uma trilogia, e talvez por isso, ao contrário do texto anterior, este se prolongue um pouco mais, pois tem, em si, a função de amarrar as idéias de minimalismo, essencialismo, slow-living e, quem sabe, ser um pouco audaz e lançar mão de um amálgama entre os três estilos......
esta mistura talvez já exista, em certa parte, entre os dois primeiros aqui tratados, embora, como foi visto, é uma associação feita de forma equivocada, a priori...
e tal discrepância só se fez possível por partirmos do conhecimento de suas origens e trilhando seu transbordamento, da arte e da filosofia, respectivamente....
então, utilizaremos do mesmo princípio para conhecer o slow-living...
♦ uma revolução contra a pressa ♦
enquanto o minimalismo se origina na arte e o essencialismo na filosofia, o slow-living tem sua origem na política, numa postura ativista contrária à normalização do fast-food...
na segunda metade da década de 80, chegava ao centro histórico de roma (itália), a primeira loja da maior rede de fast-food do mundo, o que gerou atitudes de protestos, lideradas pelo jornalista carlos petrini (hoje embaixador da boa vontade da fao, organização das nações unidas para a alimentação e a agricultura)...
à este movimento de resistência se deu o nome de slow-food, contrapondo o fast-food, buscando um outro modo de se relacionar com o alimento, reatando os laços de contato e de prazer com todo o processo que gira em torno do alimento (plantio, cultivo, distribuição, cuidados, preparo, experimentação, convívio, experiências e etc).....
ou seja, gerar uma maior aproximação com o tempo e carinho que são necessários para desfrutar de sensações únicas, seja pelo sabor gerado, seja pela consciência do esforço (pessoal e coletivo, em cadeia) necessário para o resultado, seja pela aproximação com outras pessoas, com o alimento e consigo mesma(o)...
♦ da comida para a vida ♦
e, assim como no minimalismo e no essencialismo, essas características transbordaram para um estilo de vida chamado de slow-living...
não mais lento, mas mais presente, contrário ao mais rápido e a menor paciência de uma vida "fast", vivenciando, assim, todo o processo, independentemente de falhas ou sucessos, priorizando aqui a consciência do consumo contra, não só à quantidade, mas à velocidade deste.....
o movimento slow expandiu-se para diversas áreas: slow cities (cidades que valorizam qualidade de vida sobre crescimento), slow fashion (moda sustentável e atemporal), slow travel (viagens imersivas), slow parenting (criação de filhas(os) com menos pressão e mais presença), até slow media (consumo consciente de informação) e slow content (conteúdos de consumo lento em oposição aos "shorts" e ao "2x")...
como observa carl honoré em seu livro "devagar: como um movimento mundial está desafiando o culto da velocidade": "a filosofia slow não se trata de fazer tudo em câmera lenta..... trata-se de fazer as coisas na velocidade certa – às vezes rápido, às vezes devagar, e às vezes em algum ponto intermediário".......
♦ a tirania da velocidade ♦
vivemos em uma época onde a velocidade é quase uma religião.....
"tempo é dinheiro", nos diz o capitalismo.....
"otimize cada segundo", sugere a cultura da produtividade.....
"não perca tempo", advertem os gurus do sucesso...
a filósofa byung-chul han, em seu livro "sociedade do cansaço", argumenta que essa aceleração constante nos leva a um estado de exaustão crônica, tanto física quanto mental......
para ele, a "violência neuronal" da hiper-atenção e multitarefa está criando uma sociedade de pessoas esgotadas e deprimidas...
a tecnologia, que prometia nos liberar e dar mais tempo livre, muitas vezes fez o oposto.....
estamos sempre disponíveis, sempre conectadas(os), sempre respondendo, sempre consumindo informação....
o tempo entre o desejo e sua satisfação foi reduzido a quase nada e esse imediatismo todo, essa pressa entre querer e ter acaba roubando o tempo precioso da espera, da antecipação, da reflexão, do descanso e de momentos quietos......
essas "não ações" seriam, justamente, o terreno fértil necessário para entendermos melhor quem somos, cada uma(m) de nós em sua essência, e como as coisas realmente são......
mas, sem essa pausa, como podemos conversar de verdade e nos conectar com os resultados do que fazemos????
como apreciar e sentir atentamente o processo inteiro para poder, quem sabe, ajustá-lo, melhorá-lo em seus detalhes????
♦ a prática no cotidiano ♦
o slow-living se manifesta em pequenas práticas cotidianas:
ler um livro, só se preocupando com a leitura no tempo destinado a isso;
estar envolvida(o) por inteiro com aquilo que se faz a cada momento e apreciar o que se recebe;
buscar a calma para entender o que se coloca em nossa presença e o que ela nos provoca;
comer sem distrações, saboreando cada garfada;
caminhar prestando atenção ao entorno, em vez de sempre correr;
conversar realmente escutando, não apenas esperando sua vez de falar;
trabalhar com foco total em uma tarefa, em vez de multitarefas constantes;
desconectar-se regularmente da tecnologia para reconectar-se consigo mesma(o);
cultivar hobbies que exigem paciência e atenção: jardinagem, artesanato, cozinha.
como sugere thich nhat hanh, mestre zen e defensor da atenção plena: "a paz está em cada passo.... o objetivo é o próprio caminho"...
essa idéia de valorizar o processo, não apenas o resultado, é central no slow-living.....
♦ os extremos e seus riscos ♦
assim, como um minimalismo extremo tira nossa individualidade, requisitando o essencialismo como solução e expansão.....
um essencialismo extremo, primeiramente, nos fecha a novas sensações e conhecimentos que poderiam revelar uma conexão com algo distante da realidade atual....
e posteriormente nos coloca numa corrida desesperada para experimentar tudo que cabe em uma vida tão curta.... requisitando agora ajustes do slow-living.....
mas, como disse no início, este texto pretende apresentar um enlaçe entre os três estilos de vida apresentados, uma vida extremamente "slow" também ocasionará problemas....
o que vai nos determinar uma ligação não linear, mas sim circular entre os três....
explico melhor, o extremo de uma vida "slow" acarretaria em apreciar tudo em excesso, até o seu fim, caso contrário não apreciariamos em sua totalidade....
há aqui o risco de um retorno a uma maximização indiscriminada, fazendo com que um excesso crie outras carências, fechando o ciclo novamente com a necessidade do pensamento minimalista......
♦ o amálgama da tríade consciente ♦
esse conceito circular é um todo, ao meu ver, muito maior e mais forte que a soma das partes....
os três estilos se caracterizam por um consumo mais consciente das coisas, um viver mais focado e um menor desperdício de vida, não vivendo aquilo que não somos ou não queremos.....
podemos visualizar estes três conceitos como dimensões complementares de uma vida consciente:
o minimalismo nos pergunta: "do que realmente preciso????"
o essencialismo questiona: "o que realmente importa para mim???"
o slow-living indaga: "como posso estar plenamente presente neste momento???????"
juntos, formam uma abordagem holística que nos ajuda a navegar a complexidade da vida contemporânea com mais intencionalidade e menos automatismo...
é se reconectar com a essência cíclica da natureza, tudo vem de algum lugar, ocupa um espaço, contém uma energia, que precisa retornar a lugar, espaço e energia outros, em equivalência, para uma permanência efêmera do todo, e só assim continuarmos presentes nesta permanência....
o filósofo e ecologista david abram argumenta que perdemos nossa conexão sensorial com o mundo natural, com os ritmos do dia e da noite, das estações, das marés...
essa tr[iade nos convida a recuperar essa sintonia com os ciclos naturais, a reconhecer que somos parte de algo maior......
em um mundo que valoriza o linear, o progresso constante, o crescimento sem fim, esse conceito nos lembra da sabedoria do circular, do cíclico, do ritmo natural de expansão e contração, atividade e descanso...
♦ um convite à reflexão pessoal ♦
não vou deixar nenhuma pergunta aqui, já deixei algumas no texto e acredito que as que vocês mesmas(os) podem fazer serão muito mais fortes e significativas à essência pessoal de cada uma(m).....
espero que as leituras estejam sendo boas jornadas para vocês, assim como é para mim escrever as paisagens deste caminhar.....
talvez a verdadeira sabedoria esteja em encontrar nosso próprio ritmo, aquele que nos permite viver de acordo com nossas necessidades essenciais, sem excessos que nos distraem do que realmente importa, e com a presença plena que nos permite saborear cada momento...
como diria o poeta mario quintana: "não faças da tua vida um rascunho, poderás não ter tempo de passá-la a limpo"...
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no mais, até mais!!!
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antes dessa trilogia exploramos as amarras e seguranças do pudor.....
vale a pena conferir!... [leia aqui]
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